segunda-feira, 21 de abril de 2014

Noé ousa e vai além do “filme bíblico”

 Em um dos grandes momentos do novo filme de Darren Aronofsky, Noé (Russell Crowe) conta para seus filhos a mesma história que ouviu de seu pai, que por sua vez ouviu de seu avô, sucessivamente até chegar no primeiro homem, Adão: a história da criação. O que se segue é uma sequência belíssima e assustadora, em que os sete dias da criação do mundo são narrados com a base do texto do Velho Testamento, integrado ao Big Bang que deu origem ao Universo e à Teoria da Evolução de Darwin. Os “dias” divinos podem ser eras, encapsuladas no trabalho do Criador (e nunca Deus) em erguer um novo mundo, em fazer do nada, vida. Noé não é um “filme bíblico” na definição clássica do termo. Mas é um épico de fé e obsessão que coloca o profeta na posição de zelador, carcereiro e ativista, que atende a um chamado, entende sua função na Terra e não vai deixar que nada fique entre ele e a tarefa para a qual foi designado. [...] A ideia de interpretar e adaptar a passagem da Bíblia sobre o dilúvio, a arca e o que aconteceu depois (uma passagem pequena, por sinal) assolava a mente de Aronofsky desde que ele tinha 13 anos, quando escreveu um poema sobre o tema, posteriormente sendo premiado pelo texto. Religião, embora seja a matéria prima da história, não é a mola que impulsiona o projeto: é o fascínio em materializar um conto presente em escrituras de todas as religiões, uma metáfora para o fim de tudo e seu renascimento.Embora, como acredita o próprio Russell Crowe (em grande atuação), as evidências físicas e geológicas em todo o planeta corroborem que, um dia, fomos cobertos por água. [...]

Fora dos textos bíblicos surge Ila (Emma Watson), adotada pela família ao ser encontrada em um acampamento em ruínas quando bebê, com uma lesão que a deixou estéril. Ila se envolve romanticamente com Sem, deixando em Cam a esperança de que, quando chegar a hora, seu pai também permitirá que ele encontre uma esposa. Mas a obsessão de Noé em interpretar a tarefa apontada pelo Criador (suas visões vem em sonhos, também uma maneira esperta em mostrar essa comunicação divina) o coloca como zelador dos inocentes – ou seja, os animais aglomerados e colocados em hibernação na arca –, que seriam os únicos herdeiros da Terra depois de tomada pelas águas. [...]

Para auxiliar na tarefa de erguer a arca, o profeta tem o auxílio dos Guardiões, gigantes de pedra que, na verdade, são anjos caídos, cuja luz foi aprisionada nas entranhas da Terra – tudo porque ousaram ajudar o homem em sua jornada, desviando-se dos desígnios do Criador quando o fruto proibido pôs fim à harmonia no paraíso.

Darren Aronofsky teve cuidado em seu roteiro (escrito com Ari Handel) para ser respeitoso com qualquer crença. Ainda assim, o texto bíblico, apesar de importante e inspirador e até obsessivo para muitos que o seguem literalmente, é apenas mais um livro. Como tal, é passível de adaptação, de adequação narrativa, de receber o input do diretor – que, afinal, é quem tem a visão criativa para materializar uma história. Seja na personalidade do protagonista, seja nos personagens adicionados à trama, ou nas passagens alteradas para a fluidez narrativa, Noé é um trabalho impecável, ainda que de difícil empatia. Em nenhum momento é um filme a ser abraçado, não existe o golpe emocional presente, por exemplo, em Réquiem Para Um Sonho ou O Lutador. Algumas passagens, principalmente as mais dramáticas, que iluminam o principal dilema de Noé em relação à sua família e à sua tarefa, são conduzidas com mão pesada – e perdem seu impacto emocional. Mas são pequenos pecados em um filme que decididamente coloca a cabeça para funcionar e abre espaço para questionamento e para reflexão – tudo embalado no melhor espetáculo que o cinema hollywoodiano pode comprar. Este é seu maior triunfo.

Fonte: Roberto Sadovski Uol

Nota. Nestes últimos tempos vemos uma enxurrada de misticismo e espiritualismo invadindo a mídia, em especial o cinema. Nem mesmo uma história eminentemente bíblica foi respeitada. Isto na realidade é uma   estratégia do inimigo das almas para afastar as pessoas de Cristo e das verdades bíblicas.

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